A Lebre e a Raposa

Em algum lugar, uma lebre corre de uma raposa. A lebre corre por sua vida e a raposa corre por seu alimento. Podemos dizer que os dois correm por motivos diferentes, que a raposa pode não correr com todas as forças, pois a perda de uma refeição não equivale ao preço que a lebre pagará por ser vagarosa. Porém, ambas as corridas tem em comum um aspecto dual, que abrange não apenas a corrida que envolve músculos e ossos, mas uma corrida muito mais antiga, evolutiva: a hipótese da Rainha Vermelha.

O modelo mais didático da Rainha Vermelha foi também o modelo mais estudado e testado durante muito tempo. A evolução cíclica auto-alimentada da interação presa-predador é, além de atraente, básica e abrangente, pois como será colocado posteriormente, não apenas inclui a clássica caça da lebre pela raposa, mas também pode ser usado em muitos aspectos da evolução dos organismos, tornando, assim, os termos ecológicos de ``presa'' e ``predador'' não tão restritos, podendo-se estender para qualquer interação na qual, obrigatoriamente, o que é bom para um lado é ruim para o outro e vice e versa Dieckmann95. Nesse tipo de interação não há a inclusão de qualquer fator abiótico na adaptação, sendo os fatores bióticos necessários e suficientes para promover a evolução Hoffman91.

Modelos baseados em tais interações normalmente apresentam três possíveis desfechos Dawkins79: evolução até um ponto fixo, onde os valores dos fenótipos tenderiam ao um ponto de equilíbrio; vitória de um dos lados, onde o predador acaba extinto; e evolução cíclica, onde não há apenas um ponto fixo de atração, mas vários pontos caóticos de atração evolutiva, que seria contrário a idéia de estase. Temos, então, três possíveis resultados constituídos de duas dicotomias: uma determina a ausência ou presença de um atrator, e a outra que delimita se este (atrator) é ou não um ponto fixo. [Dieckmann et al.(1995)Dieckmann, Marrow & Law] afirmam que o comportamento cíclico da evolução não é um artefato do determinismo ou do monomorfismo, pois modelos polimórficos e estocásticos também foram testados e o mesmo resultado foi encontrado. O modelo de presa e predador é condizente não só com outros modelos, mas também apresenta resultados plausíveis. Porém, apesar disso, durante certo tempo a hipótese da Rainha Vermelha revelou-se pobre em observações empíricas e testes em laboratórios conclusivos. A idéia era boa, mas não parecia dar certo.

Porém, o estudo de comunidades que englobavam indivíduos sexuais e assexuais cresceu e com as análises dos dados foi observada correlações com os modelos de presa-predador nessas comunidades, relacionando os graus de parasitismo com o grau de sexualidade ou diversidade, sendo o sexo uma contra-resposta adaptativa à infectividade do parasita. Tanto o parasita quanto o hospedeiro podiam ser presa e predador (uma interação ecológica ao nível de espécie não é unilateral), e os níveis de sexualidade ou diversidade e infectividade poderiam ser medidos e correlacionados.

Leonardo 2003-12-20