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Contrato de lote tem "parcelas-surpresa"
Lesados podem recorrer a três órgãos
 



Contrato de lote tem "parcelas-surpresa"
Documento remete a outro que permite que a empresa faça melhorias sem consultar os donos

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Ao assinar sem ler um contrato de compra de um lote de terra, o consumidor pode estar firmando junto um cheque em branco em nome do loteador. Isso porque existem documentos com cláusulas que dão direito à empresa responsável pelo loteamento, à revelia do comprador, de fazer melhorias no terreno. O resultado vem na forma de carnês de pagamento.

Em 1989, o músico Claujuar Melo de Alencar, 42, comprou um lote da Momentum, empresa que se tornou conhecida ao anunciar na TV os loteamento Thermas de Santa Bárbara e Ninho Verde.

É neste último que está localizado seu terreno, que tem 450 m2 e vale cerca de R$ 7.000. O empreendimento fica perto de Tatuí (135 km a oeste de São Paulo).

O contrato assinado por Alencar faz menção a outro documento que autoriza a empresa a fazer melhorias no loteamento. O gasto das obras é dividido de acordo com o tamanho dos terrenos. O músico, que já paga há 11 anos uma taxa de conservação para a realização de serviços básicos, ficou surpreso com a nova taxa.

"Nunca vi esse documento antes", afirma Alencar, embora tenha firmado um contrato declarando tê-lo recebido. A empresa diz que apresentou tanto o contrato quanto o documento com a cláusula de melhorias.

Cláusulas-surpresa
"São as chamadas cláusulas-surpresa, que aparecem quando o consumidor não é informado sobre sua existência na compra", diz Roberto Senise de Lisboa, da Promotoria de Defesa do Consumidor do Ministério Público.

Segundo Senise, esse tipo de cláusula fere o Código de Defesa do Consumidor em pelo menos dois artigos _31 e 51. O primeiro diz que a informação sobre o produto deve ser clara e ostensiva, e o outro, que são inválidas as cláusulas que colocam o consumidor em desvantagem exagerada.

Tanto o Procon (Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor) quanto a Aelo (Associação de Empresas de Loteamento de São Paulo) concordam sobre a obrigação dos loteadores em explicar os contratos ao comprador.

"O consumidor é o elo mais fraco na relação de consumo, pois não tem os conhecimentos técnicos. O vendedor deve esclarecer o contrato", diz Mônica Guarischi, técnica de habitação do Procon.

"Há orientação para que as empresas esclareçam tudo ao consumidor", diz Sérgio Guimarães Pereira Júnior, 36, presidente da Aelo. A Momentum é afiliada à Aelo.

Assinar sem ler
Segundo Marcos Diegues, gerente de serviços ao associado do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), se a empresa não destacou as cláusulas, ela errou. Mas isso não tira a obrigação do comprador de pagar a taxa.

O arquiteto Sérgio Álvaro de Oliveira, 38, exigiu toda a documentação antes de comprar um lote em Ibiúna (70 km a oeste de São Paulo). "É obrigação do vendedor ter tudo à mão", afirma Oliveira, que preveniu-se contra possíveis cláusulas-surpresa. (LUCIANO GRÜDTNER BURATTO) [top]
 



Lesados podem recorrer a três órgãos
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Mesmo tendo assinado o contrato, quem se sentir lesado tem o direito de revisá-lo caso as cláusulas sejam consideradas abusivas.

A primeira parada é o Procon. Os técnicos da fundação poderão informar se há ou não ilegalidade no contrato assinado. Se houver, a instituição notificará a empresa para que seja realizada uma audiência conciliatória.

O comprador pode, então, pedir a suspensão dos pagamentos e a restituição do que foi pago. Se a audiência não resolver o problema, é necessário recorrer a outro órgão, o Juizado Especial Cível, antigamente chamado de Juizado de Pequenas Causas.

Valor da ação
Nesse caso, se os valores envolvidos forem inferiores a 20 salários mínimos, o equivalente a R$ 3.020, não é necessário contratar um advogado.

Se estiverem entre 20 e 40 salários mínimos (de R$ 3.020 a R$ 6.040), a presença do profissional é obrigatória. Casos que ultrapassam 40 salários devem ser encaminhados à Justiça comum.

Para mover ações em juízo por meio do Ministério Público, é preciso que elas sejam coletivas. Para isso, a reclamação deve se referir a uma cláusula prejudicial comum a todos os contratos de compra e venda envolvidos na ação conjunta. (LGB) [top]
 

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